Diário de uma mãe-escritora na quarentena...
Já falei por aqui - ou em algum outro lugar "público" - que sou mãe de duas cri fantásticas. Quando decidimos engravidar, larguei o mercado formal e passei a me dedicar apenas às crianças e aos livros.
Até aí, ok.
Sempre enlouqueci nas férias? Sim, mas só até o dia em que resolvi "programar" a minha própria cabeça para compreender que estarei - eu e eles - de férias. Aí, ficou mais fácil abstrair e parei de me cobrar tanto.
Mas a quarentena me tirou do prumo.
Sim, eu sei que tirou muita gente do prumo - toda a sociedade consciente, pelo menos - mas pessoas ansiosas sofrem bastante.
Eu começo a escrever e, duas frases depois, alguém me chama.
No meio da fala do personagem, escrevi "pão". No meio de uma cena mais quentinha, saiu "matemática" (imagino que o personagem tenha até dado uma desanimada).
Decidi ir relendo e tabelando.
Mais meia hora pra engrenar, uma criança bate na outra, um grito, lágrimas de crocodilo, música relaxante no ouvido...
"Ô, mãããããeeee!"
Se eu fingir que não ouvi, será que Deus castiga?
Fechei os olhos e esperei. Se for sério, vão chamar de novo.
Música relaxante no ouvido...
O tempo passou - voando muito mais rápido do que a velocidade dos meus dedinhos teclando toda a inspiração no computador.
Sim, resolvi ficar inspirada na quarentena!
"Mãe, tá na hora do almoço", escutei. Olhei para o relógio e estava realmente quase na hora do almoço. Eu teria mais uns vinte minutos antes de precisar levantar do computador para começar a preparar. Mas quem disse que eu consegui voltar a me concentrar?
Almocei rapidinho e voltei.
Música relaxante no ouvido...
Reli uns três parágrafos (pra dar aquela engrenada) e comecei a "produzir".
"Mãe, tá na hora de fazer o trabalho da escola."
Duas frases.
"Não entendi o que é pra fazer." Expliquei.
Duas palavras.
"Vê se tá certo." Conferi.
Duas letras.
"E agora?" Respirei fundo.
Eu vi muita gente crucificando as mães que estão em desespero. Não posso fazer isso. Primeiro, reconheço a minha pequenez. Segundo, porque eu mesma estou em desespero.
Dizem que o primeiro passo é reconhecer a doença. Então, estou com Desesperatovid-2020.
Sim, eu amo meus filhos com uma intensidade absurda e esta quarentena está sendo quase o teste de fogo. E olha que sou uma "stayhome-mom". Ainda assim, é enlouquecedor não poder sair.
O "poder" é o problema. Eu amo ficar em casa, isso é fato. E, muitas vezes, deixo de sair porque prefiro ficar aqui com eles. Mas não "poder" é forte demais, como tirar minha liberdade, cortar minha asa. Aí, a vontade de sair cresce.
Mas, voltando ao livro...
"Mãe, tá na hora do lanche?"
Suspirei. "Ainda não", foi o que eu disse com um grito que soou um pouco mais irritado do que Içami Tiba diria ser saudável para as crianças.
Dois segundos depois, duas crianças famintas me cutucaram. "E agora?"
Fui, coloquei o lanche e corri pro computador.
Melhor nem ligar a música, porque quando eles terminarem de lanchar já vai estar quase na hora de preparar o jantar.
"O que importa é que eles estão com saúde", mantralizei pra mim mesma.
Respirei fundo e, quando fui dormir, agradeci a Deus por mais um dia longe do Covid.
Desesperatovid é menos grave, sem dúvida.
No mais, pessoal, fiquem bem!